Dez coisas que toda criança com autismo gostaria que você soubesse
Este
texto de Ellen Notbohm (com tradução de Dario Diniz Guedes) é muito
interessante, já havia lido em outra ocasião, mas li novamente estes dias e
resolvi postar aqui no blog. Ele é longo, mas posso ter a certeza de que não se
arrependerão da leitura. Ele é direcionado à todas as pessoas, independentemente
de conviver ou não com autistas. Também achei um vídeo, onde o texto é mais
simplificado, não menos interessante.
O vídeo:
E o texto na íntegra:
Aqui estão dez coisas que qualquer criança com autismo gostaria que você soubesse:
O vídeo:
E o texto na íntegra:
Aqui estão dez coisas que qualquer criança com autismo gostaria que você soubesse:
1.
Mais importante e antes de tudo, eu sou uma criança. Meu autismo é
apenas um aspecto de toda minha personalidade. Ele não me define enquanto
pessoa. Você é alguém com pensamentos, sentimentos e muitos talentos, ou alguém
gordo (acima do peso), “míope” (usa óculos), ou “desastrado” (sem coordenação,
não tão bom em esportes)? Estas podem ser características que eu percebo quando
lhe vejo pela primeira vez, mas não necessariamente tudo que você é.
Sendo
adulto, você tem certo controle sobre como define a si mesmo. Se você quiser ser
conhecido por uma característica sua, você consegue fazê-la
percebida. Em sendo criança, ainda estou me descobrindo. Nem eu ou você
sabemos ainda do que sou capaz. Definir-me por uma de minhas características
corre o perigo de se ter expectativas muito pequenas. E se eu perceber que você
não acha que “sou capaz”, minha resposta natural será: “Para que tentar?”
2.
Minhas percepções sensoriais estão desorganizadas.Integração sensorial
pode ser um dos aspectos mais difíceis para se entender no autismo, mas é sem
dúvida o mais crítico. Significa que todas as visões, sons, cheiros, gostos e
toques do dia-a-dia, que talvez você sequer note, podem ser extremamente
dolorosos para mim. O próprio ambiente no qual tenho que viver se mostra
freqüentemente hostil. Eu posso aparentar estar ausente ou hostil com você, mas
eu realmente estou apenas tentando me defender. Aqui está o porquê de uma
“simples” ida ao mercado parecer um inferno para mim:
Minha
audição pode ser hipersensível. Dúzias de pessoas falando ao mesmo tempo. O
auto-falante anunciando as ofertas do dia. O sistema de som toca músicas de
fundo. Maquinas fazem ruídos. Caixas registradores apitam e se abrem. O moedor
de café se move com ruídos. Os açougueiros fatiam a carne, crianças em pranto,
carrinhos rangem, a luz fluorescente fica zunindo! Meu cérebro não consegue
filtrar todos estes estímulos e eu fico sobrecarregado.
Meu
olfato também pode ser muito aguçado. Sinto o peixe no balcão que não está tão
fresco, o homem próximo a nós não tomou banho hoje, o mercado oferece petiscos
de salsicha, o bebe à nossa frente sujou a fralda, estão lavando picles com
amônia no corredor 3…. não consigo organizar tudo isto! Tenho náuseas
horríveis.
Porque
sou visualmente orientado (veja mais sobre isto abaixo), este pode ser meu
primeiro sentido a ser super estimulado. A luz fluorescente não apenas é clara
demais, como chia e zune. O estabelecimento parece pulsar e machuca meus olhos.
A luz oscilante bagunça e distorce tudo o que estou vendo – o lugar parece estar
mudando constantemente. Há uma claridade na janela, muitas coisas dificultando
meu foco (que eu consigo compensar com uma “visão exclusiva”, como um túnel),
ventiladores de teto ligados, muitos corpos em constante movimento. Tudo isto
afeta meu sistema vestibular e sentidos proprioceptivos, e agora eu nem consigo
dizer onde meu corpo se encontra no espaço.
3.
Por favor, lembre-se de distinguir “não
quero” de “não
consigo”. Receptividade, linguagem expressiva e vocabulário podem
ser grandes desafios para mim. Não é que eu não escute as instruções, é que eu
não consigo entender você. Quando me chama do outro lado do quarto, é isto que
escuto: “$%$#%#,
Billy. %$#%@#$%…”. Em vez disto, fale diretamente comigo com palavras
simples: Por favor, guarde seu livro na prateleira, Billy. É hora de você
lanchar”. Assim você me diz o que fazer e o que acontecerá em seguida. Fica bem
mais fácil para eu cooperar.
4.
Eu penso concretamente. Isto
significa que eu interpreto tudo literalmente. É muito confuso quando
você diz “Segura as pontas!” quando o que você quer dizer é “Espere até eu
voltar”. Não diga que algo é “mamão com açúcar” quando não há nenhuma sobremesa
à vista e o que você está realmente falando é “será fácil para você fazer”.
Quando você diz “Jamie realmente queimou a pista”, eu imagino uma criança
brincando com fósforos. Por favor, apenas diga “Jamie correu muito
rápido”.
Gírias,
trocadilhos, nuanças, duplo-sentidos, inferências, metáforas, alusões e
sarcasmos não fazem sentido para mim.
5.
Por favor, seja paciente com meu vocabulário limitado. É difícil dizer
para você o que preciso quando eu não conheço as palavras para descrever meus
sentimentos. Posso estar com fome, frustrado, amedrontado ou confuso, mas por
enquanto estas palavras estão além da minha habilidade de expressão. Fique
atento para minha linguagem corporal, isolamento, agitação e outros sinais de
que algo está errado.
Ou,
tem o lado oposto: Posso me expressar como um “pequeno professor” ou estrela de
cinema, despejando palavras ou scripts incomuns para meu nível de
desenvolvimento. Estas mensagens eu memorizei do mundo ao meu redor para
compensar meus déficits de linguagem, pois sei que esperam que eu responda
quando falam comigo. Estes elementos podem vir dos livros, TV, fala de outras
pessoas. É conhecido como “ecolalia”. Não necessariamente entendo o contexto ou
os termos que estou usando, apenas sei que isto me tira de alguns incômodos por
surgir com uma resposta.
6. Como
linguagem é muito difícil para mim, eu
me oriento muito pela visão. Por favor, mostre-me como fazer alguma
coisa mais do que apenas falar comigo. E, por favor, também peço que esteja
preparado para me mostrar muitas vezes. Repetições insistentes me ajudam a
aprender.
Uma
“agenda visual” é de grande ajuda ao longo do meu dia. Assim como a sua rotina,
ela me salva do stress de precisar lembrar o que vem depois, ajudando-me a
transitar mais suavemente entre as atividades, controlar meu tempo e atingir
suas expectativas.
Eu
não perco a necessidade de algo assim quando ficar mais velho, mas meu “nível de
representação” pode mudar. Antes de poder ler, eu preciso de orientações visuais
com fotografias ou desenhos simples. Na medida em que envelheço, uma combinação
de imagens e palavras pode funcionar, e depois só as palavras.
7.
Por favor, priorize e procure construir a partir do que eu posso fazer mais do
que aquilo que não posso fazer. Como qualquer outro ser humano, eu não
consigo aprender em um ambiente que constantemente me faz sentir que “eu não sou
bom o bastante e preciso me corrigir”. Tentar qualquer coisa nova quando estou
quase certo de que vou encontrar criticas, ainda que “construtivas”, se torna
algo a ser evitado. Procure pelas minhas virtudes e você vai encontrá-las.
Existe muito mais do que só um jeito “certo” para fazer a maioria das
coisas.
8.
Ajude-me nas interações sociais. Pode parecer que eu não queira brincar
com as outras crianças no parquinho, mas algumas vezes o caso é que eu
simplesmente não sei como começar uma conversa ou entrar numa brincadeira. Se
você encorajar as outras crianças a me convidar para brincar de chutar bola, ou
basquete, pode ser que eu fique muito feliz em estar incluído.
Eu
participo melhor em atividades estruturadas com começo e fim claros. Eu não sei
como “ler” expressões faciais, linguagem corporal ou emoções de outros, e seria
muito bom ter auxilio para respostas sociais adequadas. Por exemplo, se dou
risada quando Emily cai no chão, não é porque achei isto engraçado, mas é que eu
não sei a resposta apropriada. Ensine-me a perguntar “Você está bem?”.
9.
Tente identificar o que inicia meus surtos. Surtos, ataques, explosões,
ou seja lá como você queira chamar, são ainda mais horríveis para mim do que
parecem a você. Eles acontecem porque um ou mais dos meus sentidos se
sobrecarregou. Se você conseguir descobrir o porquê de meus surtos acontecerem
eles podem ser prevenidos. Faça anotações sobre as situações, horários, pessoas
e atividades. Pode surgir um padrão.
Procure
se lembrar que todo comportamento é uma forma de comunicação. Ele lhe mostra,
quando minhas palavras não conseguem, como eu percebo algo que está acontecendo
em meu ambiente.
Pais,
mantenham isto em mente: Comportamentos que persistem podem ter uma causa médica
associada. Alergia a comidas e sensibilidades, distúrbios do sono e problemas
gastrointestinais podem ter profundos efeitos no comportamento.
10.
Ama-me incondicionalmente. Elimine pensamentos como “Se ele ao menos…”
e “Por que ela não consegue…”. Você não conseguiu corresponder a todas
expectativas de seus pais e você não gostaria de ser a todo momento lembrado
disto. Não escolhi ter autismo, mas isto está acontecendo comigo e não com você.
Sem a sua ajuda, minhas chances de sucesso e vida adulta independente são
baixas. Com o seu apoio e orientação, as possibilidades são maiores do que
imagina. Eu prometo a você, eu valho a pena.
E
por ultimo, três palavras: Paciência, paciência e paciência. Procure enxergar
meu autismo mais como uma habilidade diferente do que uma deficiência. Reveja o
que você compreende como limitações e descubra as qualidades que o autismo me
trouxe. É verdade que tenho dificuldade com contato visual e conversações, mas
já percebeu que eu não minto, trapaceio, zombo de meus colegas ou julgo os
outros? Também é verdade que provavelmente não serei o próximo Michael Jordan,
mas com a minha atenção a detalhes finos e capacidade de foco intenso, posso ser
o próximo Einstein, Mozart ou Van Gogh.
Eles
podem ter tido autismo também.
As
soluções para Alzheimer, o enigma da vida extraterrestres – quais tipos de
conquistas futuras as crianças com autismo, como eu, possuem à frente?
Tudo
no que posso me transformar não acontecerá sem você como minha base. Seja meu
defensor, meu amigo e veremos o quão longe eu consigo caminhar.
Este texto é da autora Ellen Notbohm, do
livro Ten Things Every Child with Autism Wishes You
Knew
Se
forem compartilhar, por gentileza cite a fonte do
texto:
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